Notícias e orientações acerca do direito do trabalho e processo do trabalho, além de assuntos relevantes do mundo jurídico em geral.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Empregador deverá arcar com honorários de advogado contratado pelo empregado

Não é de hoje que o ius postulandi vem causando discussão entre os operadores do Direito do Trabalho. Atualmente, na Justiça do Trabalho, a capacidade postulatória é facultada diretamente aos empregados e empregadores. Assim, as partes podem postular pessoalmente em Juízo, sem a necessidade de advogado, conforme o art. 791 da CLT.


Entretanto, o empregado que decidir contratar um advogado para reclamar os seus direitos na Justiça, sofrerá uma redução no valor recebido, ao arcar com os honorários contratuais. A 4ª Turma do TRT da 3ª Região manteve a sentença que condenou a Empresa Reclamada a arcar como o pagamento dos honorários devidos ao advogado contratado pelo Reclamante para propor a ação trabalhista. Para o TRT, a responsabilização da empregadora pelos honorários advocatícios visa a proteger o crédito alimentar do trabalhador que, ao contratar o advogado para reclamar os seus direitos na Justiça, sofre uma redução no valor recebido, uma vez que desse valor serão deduzidos os honorários advocatícios.


Sendo assim, a Turma entendeu não ser justo que, para receber os direitos legais que não foram devidamente pagos na vigência do contrato, o trabalhador tenha que recorrer a um advogado, perdendo até 20% dos valores que lhe seriam devidos como fruto do seu trabalho.
Nesse sentido, os arts 389 e 404 do Código Civil impõem a obrigação de o devedor responder por perdas e danos, juros e correção monetária, além de honorários advocatícios. Sendo assim, o empregado será ressarcido pelas despesas oriundas da contratação com advogado particular, nos termos do disposto nos artigos 186, 389, 404 e 944 do CC/02.


Há que se destacar que não é o caso de honorários sucumbenciais, mas de honorários advocatícios por inadimplemento obrigacional.


Acerca dos honorários sucumbenciais, tramita na Congresso Nacional um Projeto de Lei com o objetivo de alterar dispositivos da CLT, prevendo critérios para a fixação de honorários advocatícios na Justiça do Trabalho. Para maiores detalhes sobre o assunto, leia o post Extinção do "ius postulandi" e fixação de honorários de sucumbência na Justiça do Trabalho - PL 3.392/04

sábado, 21 de julho de 2012

Nova lei dispõe sobre a organização e o funcionamento das Cooperativas de Trabalho


LEI Nº 12.690, DE 19 DE JULHO DE 2012.

Dispõe sobre a organização e o funcionamento das Cooperativas de Trabalho; 

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: 

CAPÍTULO I
DAS COOPERATIVAS DE TRABALHO 
Art. 1o A Cooperativa de Trabalho é regulada por esta Lei e, no que com ela não colidir, pelas Leis nos 5.764, de 16 de dezembro de 1971, e 10.406, de 10 de janeiro de 2002 -Código Civil. 
Parágrafo único. Estão excluídas do âmbito desta Lei: 
I - as cooperativas de assistência à saúde na forma da legislação de saúde suplementar; 
II - as cooperativas que atuam no setor de transporte regulamentado pelo poder público e que detenham, por si ou por seus sócios, a qualquer título, os meios de trabalho; 
III - as cooperativas de profissionais liberais cujos sócios exerçam as atividades em seus próprios estabelecimentos; e 
IV - as cooperativas de médicos cujos honorários sejam pagos por procedimento. 
Art. 2o Considera-se Cooperativa de Trabalho a sociedade constituída por trabalhadores para o exercício de suas atividades laborativas ou profissionais com proveito comum, autonomia e autogestão para obterem melhor qualificação, renda, situação socioeconômica e condições gerais de trabalho. 
§ 1o A autonomia de que trata o caput deste artigo deve ser exercida de forma coletiva e coordenada, mediante a fixação, em Assembleia Geral, das regras de funcionamento da cooperativa e da forma de execução dos trabalhos, nos termos desta Lei. 
§ 2o Considera-se autogestão o processo democrático no qual a Assembleia Geral define as diretrizes para o funcionamento e as operações da cooperativa, e os sócios decidem sobre a forma de execução dos trabalhos, nos termos da lei. 
Art. 3o A Cooperativa de Trabalho rege-se pelos seguintes princípios e valores: 
I - adesão voluntária e livre; 
II - gestão democrática; 
III - participação econômica dos membros; 
IV - autonomia e independência; 
V - educação, formação e informação; 
VI - intercooperação; 
VII - interesse pela comunidade; 
VIII - preservação dos direitos sociais, do valor social do trabalho e da livre iniciativa; 
IX - não precarização do trabalho; 
X - respeito às decisões de asssembleia, observado o disposto nesta Lei; 
XI - participação na gestão em todos os níveis de decisão de acordo com o previsto em lei e no Estatuto Social. 
Art. 4o A Cooperativa de Trabalho pode ser: 
I - de produção, quando constituída por sócios que contribuem com trabalho para a produção em comum de bens e a cooperativa detém, a qualquer título, os meios de produção; e 
II - de serviço, quando constituída por sócios para a prestação de serviços especializados a terceiros, sem a presença dos pressupostos da relação de emprego. 
Parágrafo único. (VETADO). 
Art. 5o A Cooperativa de Trabalho não pode ser utilizada para intermediação de mão de obra subordinada.
Parágrafo único. (VETADO). 
Art. 6o A Cooperativa de Trabalho poderá ser constituída com número mínimo de 7 (sete) sócios. 
Art. 7o A Cooperativa de Trabalho deve garantir aos sócios os seguintes direitos, além de outros que a Assembleia Geral venha a instituir: 
I - retiradas não inferiores ao piso da categoria profissional e, na ausência deste, não inferiores ao salário mínimo, calculadas de forma proporcional às horas trabalhadas ou às atividades desenvolvidas; 
II - duração do trabalho normal não superior a 8 (oito) horas diárias e 44 (quarenta e quatro) horas semanais, exceto quando a atividade, por sua natureza, demandar a prestação de trabalho por meio de plantões ou escalas, facultada a compensação de horários; 
III - repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; 
IV - repouso anual remunerado; 
V - retirada para o trabalho noturno superior à do diurno; 
VI - adicional sobre a retirada para as atividades insalubres ou perigosas; 
VII - seguro de acidente de trabalho. 
§ 1o Não se aplica o disposto nos incisos III e IV do caput deste artigo nos casos em que as operações entre o sócio e a cooperativa sejam eventuais, salvo decisão assemblear em contrário. 
§ 2o A Cooperativa de Trabalho buscará meios, inclusive mediante provisionamento de recursos, com base em critérios que devem ser aprovados em Assembleia Geral, para assegurar os direitos previstos nos incisos I, III, IV, V, VI e VII do caput deste artigo e outros que a Assembleia Geral venha a instituir. 
§ 3o A Cooperativa de Trabalho, além dos fundos obrigatórios previstos em lei, poderá criar, em Assembleia Geral, outros fundos, inclusive rotativos, com recursos destinados a fins específicos, fixando o modo de formação, custeio, aplicação e liquidação. 
§ 4o (VETADO). 
§ 5o A Cooperativa de Trabalho constituída nos termos do inciso I do caput do art. 4o desta Lei poderá, em Assembleia Geral Extraordinária, estabelecer carência na fruição dos direitos previstos nos incisos I e VII do caput deste artigo. 
§ 6o As atividades identificadas com o objeto social da Cooperativa de Trabalho prevista no inciso II do caput do art. 4o desta Lei, quando prestadas fora do estabelecimento da cooperativa, deverão ser submetidas a uma coordenação com mandato nunca superior a 1 (um) ano ou ao prazo estipulado para a realização dessas atividades, eleita em reunião específica pelos sócios que se disponham a realizá-las, em que serão expostos os requisitos para sua consecução, os valores contratados e a retribuição pecuniária de cada sócio partícipe. 
Art. 8o As Cooperativas de Trabalho devem observar as normas de saúde e segurança do trabalho previstas na legislação em vigor e em atos normativos expedidos pelas autoridades competentes. 
Art. 9o O contratante da Cooperativa de Trabalho prevista no inciso II do caput do art. 4o desta Lei responde solidariamente pelo cumprimento das normas de saúde e segurança do trabalho quando os serviços forem prestados no seu estabelecimento ou em local por ele determinado. 
CAPÍTULO II
DO FUNCIONAMENTO DAS COOPERATIVAS DE TRABALHO 
Art. 10. A Cooperativa de Trabalho poderá adotar por objeto social qualquer gênero de serviço, operação ou atividade, desde que previsto no seu Estatuto Social. 
§ 1o É obrigatório o uso da expressão “Cooperativa de Trabalho” na denominação social da cooperativa. 
§ 2o A Cooperativa de Trabalho não poderá ser impedida de participar de procedimentos de licitação pública que tenham por escopo os mesmos serviços, operações e atividades previstas em seu objeto social. 
§ 3o A admissão de sócios na cooperativa estará limitada consoante as possibilidades de reunião, abrangência das operações, controle e prestação de serviços e congruente com o objeto estatuído. 
§ 4o Para o cumprimento dos seus objetivos sociais, o sócio poderá exercer qualquer atividade da cooperativa, conforme deliberado em Assembleia Geral. 
Art. 11. Além da realização da Assembleia Geral Ordinária e Extraordinária para deliberar nos termos dos e sobre os assuntos previstos na Lei no 5.764, de 16 de dezembro de 1971, e no Estatuto Social, a Cooperativa de Trabalho deverá realizar anualmente, no mínimo, mais uma Assembleia Geral Especial para deliberar, entre outros assuntos especificados no edital de convocação, sobre gestão da cooperativa, disciplina, direitos e deveres dos sócios, planejamento e resultado econômico dos projetos e contratos firmados e organização do trabalho. 
§ 1o O destino das sobras líquidas ou o rateio dos prejuízos será decidido em Assembleia Geral Ordinária. 
§ 2o As Cooperativas de Trabalho deverão estabelecer, em Estatuto Social ou Regimento Interno, incentivos à participação efetiva dos sócios na Assembleia Geral e eventuais sanções em caso de ausências injustificadas. 
§ 3o O quorum mínimo de instalação das Assembleias Gerais será de: 
I - 2/3 (dois terços) do número de sócios, em primeira convocação; 
II - metade mais 1 (um) dos sócios, em segunda convocação; 
III - 50 (cinquenta) sócios ou, no mínimo, 20% (vinte por cento) do total de sócios, prevalecendo o menor número, em terceira convocação, exigida a presença de, no mínimo, 4 (quatro) sócios para as cooperativas que possuam até 19 (dezenove) sócios matriculados. 
§ 4o As decisões das assembleias serão consideradas válidas quando contarem com a aprovação da maioria absoluta dos sócios presentes. 
§ 5o Comprovada fraude ou vício nas decisões das assembleias, serão elas nulas de pleno direito, aplicando-se, conforme o caso, a legislação civil e penal. 
§ 6o A Assembleia Geral Especial de que trata este artigo deverá ser realizada no segundo semestre do ano. 
Art. 12. A notificação dos sócios para participação das assembleias será pessoal e ocorrerá com antecedência mínima de 10 (dez) dias de sua realização. 
§ 1o Na impossibilidade de notificação pessoal, a notificação dar-se-á por via postal, respeitada a antecedência prevista no caput deste artigo. 
§ 2o Na impossibilidade de realização das notificações pessoal e postal, os sócios serão notificados mediante edital afixado na sede e em outros locais previstos nos estatutos e publicado em jornal de grande circulação na região da sede da cooperativa ou na região onde ela exerça suas atividades, respeitada a antecedência prevista no caput deste artigo. 
Art. 13. É vedado à Cooperativa de Trabalho distribuir verbas de qualquer natureza entre os sócios, exceto a retirada devida em razão do exercício de sua atividade como sócio ou retribuição por conta de reembolso de despesas comprovadamente realizadas em proveito da Cooperativa. 
Art. 14. A Cooperativa de Trabalho deverá deliberar, anualmente, na Assembleia Geral Ordinária, sobre a adoção ou não de diferentes faixas de retirada dos sócios. 
Parágrafo único. No caso de fixação de faixas de retirada, a diferença entre as de maior e as de menor valor deverá ser fixada na Assembleia. 
Art. 15. O Conselho de Administração será composto por, no mínimo, 3 (três) sócios, eleitos pela Assembleia Geral, para um prazo de gestão não superior a 4 (quatro) anos, sendo obrigatória a renovação de, no mínimo, 1/3 (um terço) do colegiado, ressalvada a hipótese do art. 16 desta Lei. 
Art. 16. A Cooperativa de Trabalho constituída por até 19 (dezenove) sócios poderá estabelecer, em Estatuto Social, composição para o Conselho de Administração e para o Conselho Fiscal distinta da prevista nesta Lei e no art. 56 da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, assegurados, no mínimo, 3 (três) conselheiros fiscais. 
CAPÍTULO III
DA FISCALIZAÇÃO E DAS PENALIDADES 
Art. 17. Cabe ao Ministério do Trabalho e Emprego, no âmbito de sua competência, a fiscalização do cumprimento do disposto nesta Lei. 
§ 1o A Cooperativa de Trabalho que intermediar mão de obra subordinada e os contratantes de seus serviços estarão sujeitos à multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) por trabalhador prejudicado, dobrada na reincidência, a ser revertida em favor do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT. 
§ 2o Presumir-se-á intermediação de mão de obra subordinada a relação contratual estabelecida entre a empresa contratante e as Cooperativas de Trabalho que não cumprirem o disposto no § 6o do art. 7o desta Lei. 
§ 3o As penalidades serão aplicadas pela autoridade competente do Ministério do Trabalho e Emprego, de acordo com o estabelecido no Título VII da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943. 
Art. 18. A constituição ou utilização de Cooperativa de Trabalho para fraudar deliberadamente a legislação trabalhista, previdenciária e o disposto nesta Lei acarretará aos responsáveis as sanções penais, cíveis e administrativas cabíveis, sem prejuízo da ação judicial visando à dissolução da Cooperativa. 
§ 1o (VETADO). 
§ 2o Fica inelegível para qualquer cargo em Cooperativa de Trabalho, pelo período de até 5 (cinco) anos, contado a partir da sentença transitada em julgado, o sócio, dirigente ou o administrador condenado pela prática das fraudes elencadas no caput deste artigo. 
CAPÍTULO IV
DO PROGRAMA NACIONAL DE FOMENTO ÀS COOPERATIVAS
DE TRABALHO - PRONACOOP 
Art. 19. É instituído, no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego, o Programa Nacional de Fomento às Cooperativas de Trabalho - PRONACOOP, com a finalidade de promover o desenvolvimento e a melhoria do desempenho econômico e social da Cooperativa de Trabalho. 
Parágrafo único. O Pronacoop tem como finalidade apoiar: 
I - a produção de diagnóstico e plano de desenvolvimento institucional para as Cooperativas de Trabalho dele participantes; 
II - a realização de acompanhamento técnico visando ao fortalecimento financeiro, de gestão, de organização do processo produtivo ou de trabalho, bem como à qualificação dos recursos humanos; 
III - a viabilização de linhas de crédito; 
IV - o acesso a mercados e à comercialização da produção; 
V - o fortalecimento institucional, a educação cooperativista e a constituição de cooperativas centrais, federações e confederações de cooperativas; 
VI - outras ações que venham a ser definidas por seu Comitê Gestor no cumprimento da finalidade estabelecida no caput deste artigo. 
Art. 20. É criado o Comitê Gestor do Pronacoop, com as seguintes atribuições: 
I - acompanhar a implementação das ações previstas nesta Lei; 
II - estabelecer as diretrizes e metas para o Pronacoop; 
III - definir as normas operacionais para o Pronacoop; 
IV - propor o orçamento anual do Pronacoop; 
V – (VETADO); 
VI – (VETADO). 
§ 1o O Comitê Gestor terá composição paritária entre o governo e entidades representativas do cooperativismo de trabalho. 
§ 2o O número de membros, a organização e o funcionamento do Comitê Gestor serão estabelecidos em regulamento. 
Art. 21. O Ministério do Trabalho e Emprego poderá celebrar convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos que objetivem a cooperação técnico-científica com órgãos do setor público e entidades privadas sem fins lucrativos, no âmbito do Pronacoop. 
Art. 22. As despesas decorrentes da implementação do Pronacoop correrão à conta das dotações orçamentárias consignadas anualmente ao Ministério do Trabalho e Emprego. 
Art. 23. Os recursos destinados às linhas de crédito do Pronacoop serão provenientes: 
I - do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT; 
II - de recursos orçamentários da União; e 
III - de outros recursos que venham a ser alocados pelo poder público. 
Parágrafo único. O Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador - CODEFAT definirá as diretrizes para a aplicação, no âmbito do Pronacoop, dos recursos oriundos do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT. 
Art. 24. As instituições financeiras autorizadas a operar com os recursos do Pronacoop poderão realizar operações de crédito destinadas a empreendimentos inscritos no Programa sem a exigência de garantias reais, que poderão ser substituídas por garantias alternativas, observadas as condições estabelecidas em regulamento. 
Parágrafo único. (VETADO). 
Art. 25. (VETADO). 
CAPÍTULO V
DISPOSIÇÕES FINAIS 
Art. 26. É instituída a Relação Anual de Informações das Cooperativas de Trabalho - RAICT, a ser preenchida pelas Cooperativas de Trabalho, anualmente, com informações relativas ao ano-base anterior. 
Parágrafo único. O Poder Executivo regulamentará o modelo de formulário da RAICT, os critérios para entrega das informações e as responsabilidades institucionais sobre a coleta, processamento, acesso e divulgação das informações. 
Art. 27. A Cooperativa de Trabalho constituída antes da vigência desta Lei terá prazo de 12 (doze) meses, contado de sua publicação, para adequar seus estatutos às disposições nela previstas. 
Art. 28. A Cooperativa de Trabalho prevista no inciso II do caput do art. 4o desta Lei constituída antes da vigência desta Lei terá prazo de 12 (doze) meses, contado de sua publicação, para assegurar aos sócios as garantias previstas nos incisos I, IV, V, VI e VII do caput do art. 7o desta Lei, conforme deliberado em Assembleia Geral. 
Art. 29. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 
Art. 30. (VETADO). 
Brasília, 19 de julho de 2012; 191o da Independência e 124o da República.
DILMA ROUSSEFF
José Eduardo Cardozo
Nelson Henrique Barbosa Filho
Carlos Daudt Brizola
Miriam Belchior
Luís Inácio Lucena Adams

domingo, 15 de julho de 2012

Jogo do Bicho: A (Im)possibilidade de Reconhecimento de Vínculo de Emprego

Na semana passada, muito se falou acerca da nova lei de lavagem de dinheiro sancionada pela Presidente Dilma, que incluiu o jogo do bicho como crime de lavagem de dinheiro. A alteração da lei endurece a punição para os envolvidos com o jogo ilegal. Os efeitos dessa nova lei começam a refletir de forma imediata. Mal a lei foi sancionada, diversos veículos de comunicação começaram a divulgar prisões de suspeitos de exploração de jogos de azar.


Com as devidas vênias da esfera penal, proponho uma discussão ainda mais interessante do que a questão da "tolerância" estatal ao jogo do bicho, sem entrar no mérito das vantagens e desvantagens de sua legalização ou criminalização.


Uma questão que surge de extremo relevo é a possibilidade ou não de haver vínculo de emprego entre o "banqueiro" e o apontador do jogo do bicho ou de qualquer pessoa que preste serviços ao dono da banca. Nos últimos anos, a Justiça do Trabalho vem recebendo cada vez mais pedidos de reconhecimento da relação de emprego  em atividades ilícitas.


Tendo em vista a extensão territorial do Brasil e a diversidade cultural entre as regiões brasileiras, não existe unanimidade acerca do tema, surgindo várias correntes. Não obstante o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST) por meio da Orientação Jurisprudencial nº 199 da SDI-1, os Tribunais Regionais têm oscilado em suas decisões, ora reconhecendo o vínculo de emprego, ora decretando a nulidade do contrato de trabalho, mas condenando o empregador a pagar apenas os salários devidos ao trabalhador, e ainda há boa parte da jurisprudência rechaçando qualquer tipo de vínculo e direitos ao trabalhador em virtude da atividade ilícita.


O contrato de trabalho constitui espécie de negócio jurídico bilateral. Sendo assim, requer, para a sua validade, a observância de elementos essenciais. A ausência de qualquer desses elementos pode comprometer a existência ou validade do contrato de trabalho.


De acordo com o artigo 104 do Código Civil, para a validade do negócio jurídico mister estejam presentes os requisitos de forma concomitante: agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; e forma prescrita ou não defesa em lei. Alem disso, o art. 166, II, CC/02 dispõe que é nulo o negócio jurídico quando for ilícito, impossível ou indeterminado o seu objeto.


Ora, por mais que o Estado e a sociedade "fechem os olhos" para a prática do jogo do bicho, fazendo com que a contravenção penal (e agora crime de lavagem de dinheiro) se trone letra morta, é de conhecimento de todos que tal prática constitui atividade ilícita. O objeto do contrato de trabalho não pode ser contrário à lei, à moral, aos princípios de ordem pública e aos bons costumes.


Além do jogo do bicho, são exemplos de contrato com o objeto ilícito:o médico que faz aborto ilegal em cínicas especializadas, a prostituta que vende o corpo em casa de lenocínio, o motorista de caminhão que faz transporte de carga contrabandeada, os que trabalham em rinhas de galos com vendas de rifas, o motorista de ônibus pirata, o contrabandista de animais em extinção, o trabalhador que exerce ilegalmente alguma profissão, o vendedor de produto receptado, o matador profissional, entre outros.


Como dito anteriormente, alguns Tribunais, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, pregam a validade do contrato de trabalho, em virtude da "tolerância" do Estado com esta atividade, apesar de ilícita. Argumentam ainda que a declaração de nulidade acarretaria em enriquecimento sem causa do "empregador". Defendem que o fato de o tomador de serviços explorar atividade classificada como contravenção penal não é suficiente para eximi-la de suas obrigações trabalhistas, quando evidenciada a relação de emprego.


Para os adeptos dessa corrente, o jogo do bicho é praticado em todo o território nacional, abertamente, e com a tolerância das autoridades, achando-se sua ilicitude inteiramente esvaziada pela falta de reação social.  Alegam que em sendo a sociedade um organismo vivo e dinâmico, deve a lei amoldar-se aos novos costumes, já que existe para servir aos homens e não estes àquela. Sabe-se que "o jogo de bicho", bem como as loterias esportivas (federais/estaduais), loto, sena e outras espécies do gênero jogos de azar, constituem vícios fincados na vida dos brasileiros, residindo a diferença única e exclusivamente, no fato de serem todos eles permitidos por lei, exceto o jogo do bicho.


A prática do jogo de bicho não é censurada pela sociedade que não esboça qualquer resistência à exploração do mesmo, nem pugna pela punição de seus controladores. Na maioria das vezes, os "empresários" que exploram essa atividade o fazem sem nenhum receio das autoridades governamentais e policiais, que tudo veem e sabem e nenhuma providência adotam para elidir sua prática. Nesse sentido, defendem também que mesmo que o "empregado" tenha ciência do objeto ilícito de seu contrato de trabalho, esse tipo de atividade não decorre apenas de um livre consenso, de espontânea vontade, mas sim, de um impulso de necessidade de sobrevivência, de se ganhar o pão de cada dia de forma digna e "honesta". E essa situação não permite que o "empregado" questione a natureza da atividade desempenhada, ainda mais quando na aparência, pelo menos, tal atividade parece lícita porque aceita tacitamente pelo Poder Público.


Sustentam ainda que a admissão de ser ilícito o trabalho desempenhado nesse ramo de atividade, implicaria na aceitação do enriquecimento sem causa, condenado pelo nosso direito positivo, o qual não permite a ninguém tirar proveito de sua própria torpeza, além de fomentar a prática de atividades ilícitas em proveito apenas do empregador-contraventor.


JOGO DO BICHO. CONTEMPORIZAÇÃO DA ILICITUDE. RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO. EFEITOS. O estoicismo que impõe a nulidade contratual em razão da ilicitude do jogo do bicho, aqui na Paraíba, deve ser contemporizado, em face do beneplácito estatal, o que enseja a aplicação da teoria justrabalhista de nulidades. Ademais, o vínculo empregatício há de ser reconhecido para evitar o enriquecimento sem causa do contraventor. Ac. (unânime) TRT 13ª Região (RO 00236.2004.011.13.00-0), Rel. Juíza Hermenegilda Leite Machado, julgado em 09/03/05 e publicado no DJ/PB de 03/04/05.


Por outro lado, o entendimento de boa parte da jurisprudência e da doutrina é no sentido de que sendo ilícito o objeto, nulo será o contrato, e, consequentemente, não poderia produzir nenhum efeito. Nesse sentido posiciona-se Vólia Bomfim. Para a autora, o reconhecimento do vínculo de emprego é absurdo, "pois o Judiciário é o guardião da ordem moral e do direito e não pode aceitar tal negócio jurídico ilícito. Ademais, não se pode prestigiar o trabalhador que pratica o crime. Não é crível imaginar a procedência de um pedido de pagamento de salário de um matador que cobra pelo serviço (assassinato) já executado". E continua a magistrada: "Nulo o ajuste em virtude do objeto ilícito, nada é devido ao empregado, sequer os salários, pois não se pode 'compensar' trabalho ilícito se o empregado dele participou diretamente. Imaginem um assassino que pleiteia o pagamento do salário, porque de fato matou as pessoas indicadas pelo empregador durante aquele ano. Seria uma aberração o judiciário deferir os salários, sob o argumento de se evitar o enriquecimento sem causa" (CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 5.ed. Niterói: Ímpetus, 2011, p. 583).


Há que se destacar que se a causa da relação é tipificada como ilícito penal, a conseqüência é a sua ineficácia jurídica, sob pena de estar também o Judiciário acobertando e favorecendo atividades ilícitas. Com efeito, o TST reiterou o seu entendimento, através da OJ nº 199 da SDI-1:
RELAÇÃO DE EMPREGO. JOGO DO BICHO. CONTRATO DE TRABALHO. NULIDADE. OBJETO ILÍCITO. CCB, ARTS. 82 E 145. CLT, ART. 3º.
É nulo o contrato de trabalho celebrado para o desempenho de atividade inerente à prática do jogo do bicho, ante a ilicitude de seu objeto, o que subtrai o requisito de validade para a formação do ato jurídico.


PRECEDENTE: RR 309635/96 - EMENTA - DA NULIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO - JOGO DO BICHO - Inobstante o jogo do bicho ser uma atividade difundida e amplamente praticada em todo o país, até tolerada com benevolência pelas autoridades policiais, o ilícito penal caracterizado como contravenção penal não está descaracterizado, sendo sujeito a punição prevista na legislação. O chefe de apuração do denominado jogo do bicho, exerce atividade ilícita, não havendo o que se cogitar em contrato de trabalho, porque ilícito o objeto e ilícitas as atividades do prestador, tomador de serviços. Assim, revela-se inaceitável que o Judiciário trabalhista, em total desarmonia com o disposto no art. 82, do Código Civil possa comungar que entre o reclamado e o seu
“chefe de apuração” exista típico contrato de trabalho ao amparo da CLT e legislação supletiva.”


Mesmo com a edição da OJ 199 da SDI-1, este entendimento não estava pacificado pela jurisprudência. Em 2006 foi suscitada pela SDI-1 a apreciação pelo Pleno do TST na forma de Incidente de Uniformização de Jurisprudência (IUJ), a fim de decidir-se pelo cancelamento ou pela manutenção da OJ 199. Nesta oportunidade, por maioria dos votos, o TST decidiu pela manutenção da OJ 199.


Nunca é demais lembrar de que trata-se de um ilícito penal. Não há norma que assegure o direito e, consequentemente, só poderíamos conceder algo pela inobservância dessa norma inexistente. Não há como abrir brecha nesse caso, pois se assim procedêssemos, teríamos de dar direito trabalhista ao menino que solta pipa nos morros para avisar aos traficantes da chegada de polícia. Além disso, o reconhecimento do vínculo de emprego em atividades ilícitas seria uma verdadeira afronta ao trabalhador que, necessitado de emprego, opta pela penosa busca por trabalho moral e legal, ainda que mediante um salário irrisório. Isso levaria à equiparação desse trabalhador honesto, que age nos termos da lei, com aquele que, muitas vezes em circunstâncias idênticas, opta pela contravenção ou pelo crime. Há que se lembrar que por trás do jogo do bicho existe toda uma atividade subjacente à esta prática ilícita, operando-se atividades ilegais de grande monta, como é o caso da lavagem de dinheiro, tráfico entre outros.


Além dessas duas correntes, há uma terceira, intermediária, que nega o vínculo de emprego, mas defere apenas os salários título de indenização. Para os adeptos dessa corrente, ainda que a atividade seja ilícita, seria incompatível com os princípios da primazia da realidade e da proteção negar, por completo, eficácia jurídica ao contrato celebrado entre as partes para coleta de apostas.


De acordo a teoria clássica das nulidades, é cediço que o ato absolutamente nulo deve ser ceifado em sua origem, de modo que, uma vez assim declarado, perde sua eficácia jurídica, com efeitos ex tunc. Em tal situação, as partes são remetidas ao estado anterior, restituindo-se-lhes os bens e valores que possuíam antes do advento do ato defeituoso. Ocorre que, no âmbito do Direito do Trabalho, esse retorno ao status quo ante se faz impossível, eis que, tendo se concretizado a realização dos serviços, não há como ser restabelecida a força despendida pelo trabalhador em prol do tomador dos serviços.


Destarte, esta corrente advoga no sentido de serem devidos somente os salários, mas a título de indenização. Como não se pode devolver ao obreiro a energia despendida em favor do empregador, reconhece-se àquele a contraprestação correspondente. E para que a invalidação do negócio jurídico não se converta em causa de enriquecimento ilícito para o empregador, a indenização cabível deve corresponder à totalidade dos salários a que o obreiro teria direito, relativamente ao labor prestado, com base no art. 182 do CC/02.


No que pese as embasadas e bem fundamentadas opiniões de renomados juristas, essas três correntes acabam por se tornarem injustas, seja por favorecer ainda mais o empregador-contraventor, beneficiando-o de sua própria torpeza e contribuindo para o enriquecimento sem causa deste, ou por conceder vínculo de emprego em atividade ilícita, ou apenas os salários em claro desrespeito à lei, à OJ 199 da SDI-1, e à própria moral.


Em primeiro lugar, cumpre destacar que o vínculo de emprego não pode ser reconhecido, uma vez que o art. 104, II do CC/02 exige para a formação do contrato, objeto lícito. Além disso, o art. 166, II, do mesmo diploma legal determina que é nulo o contrato quando o objeto é ilícito. O reconhecimento do vínculo significa que o próprio Judiciário está premiando o ilícito, o que se distancia de uma sociedade moral.


No tocante as decisões que não reconhecem o vínculo, mas concedem os salários a título de indenização com fulcro no artigo 182 do CC/02, se esquecem os ilustres julgadores do art. 183, CC/02 que excepciona a regra do art. 182, CC, prevendo que não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para obter fim ilícito, imoral, ou proibido por lei. Sendo assim, se o trabalho é ilícito, o "empregado" não terá direito a postular o seu equivalente econômico, de acordo com o art. 883, CC.


Por outro lado, se mostraria injusta a decisão que simplesmente declarasse nulo o contrato de trabalho, sem que produzisse nenhum efeito. Se assim fosse, estaria se legitimando o enriquecimento sem causa, e fazendo com que o maior responsável pela atividade criminosa se beneficiasse de sua própria torpeza.


Uma solução mais justa, a meu ver, foi adotada pelo juiz Ari Pedro Lorenzetti, da 13ª Vara do Trabalho de Goiânia, no processo nº 803/2006-6. O magistrado aplicou ao caso o parágrafo único do art. 883 do CC, que dispõe que não terá direito à repetição aquele que deu alguma coisa para obter fim ilícito, imoral, ou proibido por lei. O que se deu, reverterá em favor de estabelecimento local de beneficência, a critério do juiz. Destarte, ainda que o objeto tenha sido ilícito, isso não autoriza o empregador-contraventor a auferir ainda mais vantagens.


Não obstante a nulidade do contrato, dele resultaram consequências práticas que não podem ser desconsideradas ao argumento de que o contrato de trabalho não gera efeitos jurídicos. O fato de o contrato ser nulo não autoriza o beneficiário a ficar com a prestação dos serviços para si, uma vez que houve o efetivamente o trabalho. As consequências jurídicas, no caso, não decorrem do contrato, mas do trabalho havido. O contrato, por sua vez, serve apenas de parâmetro para se chegar ao valor equivalente ao labor prestado.


Repita-se, a simples declaração de nulidade do contrato corrobora para o enriquecimento sem causa do empregador-contraventor, que é o principal responsável pela atividade ilícita. 
Em consequência, só o obreiro, cuja culpa na ilicitude, no caso, é claramente menor do que a do empregador, é que pagaria pelo ilícito, enquanto o este último teria até maiores vantagens do que se exercesse de atividade lícita.


Desta feita, a solução mais justa ante a complexidade do tema é aquela que não beneficia nenhuma das partes, haja vista a ilicitude de suas atividades. Assim, nem o "empregado" tem o seu vínculo reconhecido e nem o "empregador" aufere maior vantagem em virtude do ilícito cometido.


Marina Quaglio